faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Histórias ante(s)passadas - 31

Esta é a estória de uma frustração. Ou de um violinista perdido. Ou de um violino que não saiu da caixa… nem da loja. Ou de como se ganhou alguma aversão à música.
Então, foi assim:
Na Rua do Sol ao Rato, no número 85, moravam três donas-de-casa, como naquele tempo havia. Moravam lá mais, mas estas três davam-se entre si, ainda que não fossem primas embora duas irmãs fossem. A minha mãe, a D. Judite, a minha tia Ermelinda e a D. Laura do 2º esquerdo.
Todas três tinham um filho. Filhos únicos os três. O Armando, mais conhecido por Armandinho porque o pai Armando se chamava, o Zé Luís, que por aqui tem andado, e este que daqui não sai. Os três com pequenas diferenças de idade, apesar de, naquelas infâncias, um ano e meio ser muito ano.
Por iniciativa da D. Laura, se me não engano, as três donas foram com os respectivos rebentos a uma escola de música, ou a um professor de música, que havia ali ao elevador de Santa Justa, cá em baixo.
Os meninos fizeram provas para avaliação de jeito e vocação, e o dito professor, com pouco sentido pedagógico, veio dar o veredicto na presença dos avaliados. O mais pequeno, que era eu, tinha jeito, mesmo muito jeito, o maior, o Armandinho, tinha jeitinho, o do meio nem por isso. Embora recomendasse continuidade para todos.
Regressados os 6 a penates, reuniram os plenários das três famílias, o do 2º direito reduzido por razões conhecidas à tia Ermelinda e ao Zé Luís, com frequentes deslocações ao número 77, onde moravam os nossos – do Zé Luís e meus – avós (acho que neste caso não, porque havia outras prioridades para pedidos de ajuda).
No rés-do-chão direito, a reunião começou com a informação sobre as potencialidades violinisticas do menino presente, com audição satisfeita mas muito cautelosa do dono-da-casa. “E então?”, perguntou este. A dona-da-casa reiterou o que já dissera (para dar força…) e completou “O professor diz que o Sérgio tem muito jeito… agora era preciso comprar um violino”. Resposta seca, e (penso eu!) nada satisfeita: “Ah! tem?... nós é que não temos dinheiro para violinos!”.
Assim se acabou uma não iniciada carreira de músico, e talvez tenha nascido alguma alergiazita a essas coisas. Que depois passou, apesar de ter ficado o trauma.
Ah!, o sr. Armando comprou um violino para o Armandinho e ele foi por ali fora a violinar até fazer todo o Conservatório. De vez em quando, dava-nos "recitais", mas mais de viola, em que era contumaz. Tanto que os outros estudos se quedaram muito cedo. Com grande desgosto da D. Laura. Tudo tem os seus custos.

3 comentários:

Maria disse...

Ter-se-á perdido um bom (com jeito) violinista, mas ganhámos todos um excelente Economista!
Para as meninas era mais piano....
:)))

Abraço

Justine disse...

Oh Maria, então o homem não podia acumular? E nós tínhamos concertos de borla, para além das aulas de MH?? Já viste o que perdemos?

Anónimo disse...

E para o (des)concerto ser completo tínhamos o quarteto de Alexandria acompanhado ao piano pela Justine e não pelo Chopin.