faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Reti(ra)do de algures...

Amar os outros
mesmo quando e onde a raiva
Amar-te
mesmo quando e onde o ódio
Amar-te (cretcheu, dizem em crioulo) e aos outros
mesmo quando e onde o amor é esmagado
Amar
mesmo quando e onde a luta
Sobre tudo amar e lutar
quando e onde
e enquanto
e sempre!
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(depois de lido um poema do José Craveirinha no Cravo de Abril)

Histórias ante(s)passadas (na prisão) - 1A

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Éramos para aí uma dúzia na chamada enfermaria geral do Aljube. Havia alguma flutuação. Entradas, saídas, idas para interrogatório com regresso incerto.
A mais recente novidade fora a vinda de dois médicos de grande prestígio: Orlando Carvalho e Seabra Diniz. Um, neurologista com grande saída na “alta sociedade”, outro, psiquiatra de muito renome.
Na sua integração no grupo, o Seabra Diniz começou a tentar incutir-nos o hábito de fazermos uns exercícios de descontracção e auto-controlo que ele praticava que ele praticava em todas as circunstâncias (até nos interrogatórios). Consistiam numa série de frases que nos dizíamos a nós mesmos, se possível deitados e em posição de total abandono.
Não sei se me lembro de todas as frases, mas ainda agora repito algumas… e com resultados positivos. “Sinto o braço direito mais quente”, “sinto o braço direito mais pesado”, “a respiração é profunda e prolongada”, “o coração bate calmo e regular”, sinto a testa fria”, “a zona do plexo solar está fresco”...
Convenceu-nos facilmente e, quando possível, deitávamo-nos nas camas alinhadas contra a parede e, sob o seu manso comando íamos dizendo as frases. E sentíamos o braço mais quente e mais pesado (para os canhotos seria o esquerdo), depois o resto do corpo, a cabeça fria, respirámos calma e repousadamente, o coração batia compassadamente. Tudo!
Até que um novo “habitante” veio perturbar um pouco o que estava ser uma quase rotina. Era um estivador, não percebeu aquilo dos plexos solares, riu-se daquelas coisas, resistiu um bocado a entrar no grupo, até que se decidiu. E, depois de alguns dias – poucos – de observação, também se deitou na sua cama e começou a dizer as frases. Baixo e para dentro de si.
Eis senão quando, com todos concentradíssimos nos exercícios, ouve-se a sua voz, cava e rouca, dizer alto e bom som: “sinto os colhões muito pesados”.
Foi gargalhada geral, claro.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Antes de...

10. o Suicida avisou:
  • "Não digam que não avisei."

11. o Suicida confessou:

  • "Tenho medo de ter coragem!"

12. o Suicida confessou:

  • "Tenho medo de não ter coragem!"

13. o Suicida confessou:

  • "Tenho medo!"

Antes de...

7. o Suicida temeu-se:
  • "Vamos lá a ver se isto não doi..."

8. o Suicida ironizou:

  • "Vamos lá a ver se não escapo desta..."

9. o Suicida pré-viu, preveniu e corrigiu:

  • "Vamos lá a ver... coisa nenhuma."

terça-feira, 28 de outubro de 2008

La paz, que es lucha encendida,
vuelo para una paloma,
sol y tierra, sin herida.

Rafael Alberti
1990

Camarada e amigo de um dia

Porque a Maria me fez chorar.
E cantar. E contar:

Um dia, nesses tempos em que Portugal foi futuro, Paco Ibañez foi convidado (convocado!) a vir a Portugal participar numa iniciativa do CPPC.
Fiquei com a tarefa de o receber e acompanhar.
Lembro-me que de onde e em que voo chegaria, foi a primeira questão a que ninguém me soube responder. Nem havia tempo, nestes tempos, para essas minudências. Que eu me desenrascasse!
Desenrasquei-me. Usei conhecimentos na TAP e no aeroporto e, nesses tempos de companheirismo e solidariedade, foi possível saber que aquele passageiro vinha no voo de Paris que chegava às tantas horas à Portela. E lá estive eu, à espera de um homem com uma guitarra como bagagem.
Era grande o homem e grande foi o abraço. Tudo simples como as coisas mais complicadas.
Levei-o quase directo para o São Luís (ou foi no Trindade?). A iniciativa correu muito bem. Casa cheia, grande entusiasmo e um Paco Ibañez como nós, igualzinho a nós, a cantar e a fazer-nos cantar.
Acabada a sessão, um grupo (que se acuse se houver quem me leia e tenha ido…) foi cear a uma tasca ali nas traseiras da Avenida de Roma. Em convívio vivo e alegre e pela madrugada dentro. Outras voltas demos por lugares amigos e camaradas.
O Paco foi dormir as escassas hora que havia ainda para dormir a minha casa na Rua do Sol ao Rato, num quarto que por lá havia e onde tanta gente dormiu nesses tempos.
De manhã, numa manhã solarenta de Lisboa – ah!, como era linda Lisboa nesses tempos –, passeámos pela cidade e aportámos no pátio da cervejaria da Trindade para o almoço, antes de ter de o levar ao aeroporto. Conversámos animadamente, de memórias comuns, de amigos comuns, da sua carpintaria em Paris, dos futuros por que lutávamos, entre cervejas e percebes (acho que foram percebes) antes dos inevitáveis bifes.
Levei-o ao aeroporto. Um segundo abraço, igual ao primeiro mas diferente. Tão camarada como o primeiro, de amigos o segundo.
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Nunca mais o vi. Poucos dias (ou meses, ou anos) depois, neste intervalo de 3 décadas, telefonei-lhe e abraçámo-nos pelo telefone. Depois… nunca mais. Tenho a certeza que ele, mesmo que não me reconheça, se lembrará daquele fim de tarde e noite e manhã da sessão da Paz num Portugal em revolução e de um amigo que o acompanhou.

Antes de

6. o Suicida vangloriou-se:
  • "Q'é lá isso?... o ponto final é comigo!"

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Antes de...

5. o Suicida blasfemou:
  • "Dizem que me deste a vida... mas sou eu que m'a tiro!"
    (e atirou-se!)

domingo, 26 de outubro de 2008

Um exemplo!

Acabo de receber, de um camarada, este comentário a um dos meus posts:

"Há pouco, fazendo zapping na tv, acabei por cair nos comentários do prof. sabe tudo, Marcelo, que sabendo tudo foge de tudo que o responsabilize, que teve a ousadia de dizer que de todos os líderes partidários só Louçã falou da crise internacional. Não sei se devo classificá-lo como distraido ou desonesto. Na passada 5ª Feira houve um debate em Lisboa em que tu participaste assim como o Sec. Geral do PCP Jerónimo de Sousa. Na próxima 2ª Feira reune o CC do PCP para discutir a crise. Que outro partido político se preocupou em discutir a crise, as suas causas e consequências. Já agora aproveito para te dizer que com o Pedro Carvalho estive em dois debates na Póvoa de Varzim e em Vila do Conde sobre a crise, neste fim de semana, com excelente participação quer em quantidade quer em conteúdo, promovidos pelas respectivas comissões concelhias do PCP. Quem não discute? Certamente os outros. Nós há muito, mesmo há muito, vinhamos alertando para a situação que está a ocorrer. Mas que interessa isso aos comentadores pagos para venderem o peixe que lhes encomendam.
26/10/08 22:57
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Reproduzo o comentário, transformando-o em post. Com um abraço para o autor. Amanhã lho darei na reunião do CC sobre a crise... que nós não discutimos!

Antes de...

o Suicida hesitou:
  • "Ponho gravata ou vou assim?"

sábado, 25 de outubro de 2008

Antes de...

3. o Suicida lamentou-se:
  • "Não se pode ter descanso nesta vida!"

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Antes de...

2. o Suicida protestou:

  • "Porra! Não me deixaram viver..."

Antes de...

1. o Suicida justificou-se:

  • "Estou cansado de tantos sonos provisórios!"

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Para a cronyca






















Fomos até onde tem fim a terra
acima das terras que portuguesas são.
Andámos pela Galiza
pelos caminhos ditos de Santiago
de San Cibram fizemos porto e ponte
em A Corunha acostámos e ouvimos sagas de gente nossa
bordejámos a Costa da Morte
subimos às rias altas
descemos pelas rias bajas.
Se saímos de Portugal foi como se de Portugal não tivéssemos saído
voltámos pelo Minho como se no Minho tivéssemos sempre estado.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Poema em dó

Todos prós (confiança!) & nenhumzinho contra

Eram quatro senhores
muito senhores,
muito senhores de si
e uma senhora,
muito senhora,
muito senhora em mi.

E muitos senhores,
e algumas senhoras,
tudo senhores (e algumas senhoras)
bem arreados e comportados
para assistir e aplaudir.

Eram quatro senhores
para nos devolverem,
não o dinheiro – não, esse, não! –
mas a confiança;
não o dinheiro,
que, esse, não sendo deles, deles é como se fosse,
todo, todinho, e mais algum que o Estado injecte.
Para nos devolverem a confiança
que parece andar perdida de nós,
de quem o dinheiro é, como se não fosse,
e que eles – os senhores – gerem e digerem.

Eram quatro senhores
(muito engravatados, muito emproados)
e uma senhora
(muito emplumada, muito produzida)
com confiança para darem (?) e venderem(-se)
e nós, nós, confiantes nos meliantes!,
a termos de pagar – outra vez – o que é nosso.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Na mesa ao lado...

Na mesa ao lado, "ela", toda produzida e sericoteques, diz - palradora que era... e com voz gritada - "... lembro-me, quando eu era menina...".
Antes de ouvir o resto, o que não quis (diga-se de passagem), apeteceu-me interromper "Ih! há quanto tempo!...".
Qual seria a reacção?

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Qual o mais devoto?


______________
(Obrigado, Manel!)

Títulos para umas cenas baris...

'Tás c'a bolha?
Olhó balão... e a resistência dos materiais.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Manhã de outono, solarenga e frescota















Estou triste e pensativo!

Procuro cá dentro de casa o sol da manhã,

que lá fora está frescote.

E a donaminha p'ra Lisboa...
A travessa da janela e a sua sombra

servem-me de óculos escuros!

E por aqui anda "o barbas" donomeu à roda de mim...













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Além da tristeza (é mais nostalgia...)

também estou preocupado.

"O barbas" conversa comigo sobre essas coisas da crise financeira.

Mas é tudo muito complicado para gato...

que fará para humano!

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Com bicho...

Estou a acabar de comer uma das últimas maçãs colhidas de uma das árvores aqui do quintal. Uma maçã com bicho. Que o teve tendo o dito deixado marcas, como os buracos por onde teria entrado e saído.
Soube-me bem. Soube-me a maçã!
Não foi um desses produtos assépticos, luzidios, embrulhados em plástico ou "solofane" ou lá o que é, que a nada cheiram, a nada sabem, que nada são a não ser... um produto. E que, nalguns casos, vêm da África do Sul para serem vendidos na carismática "Praça da Fruta das Caldas da Raínha"!
Vivam as maçãs com bicho!