faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Histórias ante(s)passadas - 30

Esses tempos antes passados eram difíceis para os jovens. Eram-no para todos, mas eu lembro-me de quando era jovem, ou até mesmo muito jovem. Também me lembro de quando já era homem feito (ou mais ou menos...), mas as dificuldades passaram a ser outras. E já menos antes passadas. Passei por boas, passei…
O facto é que o meu pai (lá volta ele “à baila”!) era um bocado “forreta”. Ou era-o para mim, que para os amigos – e para outras coisas – era um “mãos largas”.
Concluído o 5º ano, e não querendo ser nem advogado, nem médico, nem engenheiro, nem professor das letras ou dos números, por exclusão foi decidido que iria para economista, para o que só dava saída a alínea g). Que não havia no Pedro Nunes, mesmo ali ao pé casa, onde fizera o 5º ano. Só no D. João de Castro (nunca percebi porque que é que o João de Castro era dom e o Pedro Nunes não, ainda por cima foi este que descobriu o nónio!) Mas adiante…
O meu pai dava-me, à altura, vinte e cinco tostões de semanada.
2$50, uma miséria! Com a ida para o D. João de Castro passou a ter de acrescentar, como despesas de transporte, 4 viagens diárias de autocarro (deviam ser só duas, mas a minha mãe e eu lá o convencemos que era melhor serem quatro para poder vir almoçar a casa se houvesse umas abertas…), a 1$50 cada uma, na carreira 22 até ao Alto Santo Amaro: 6$00 por dia!
Depois, quando comecei o ano com esse orçamento, após alguns estudos e viagens experimentais e exploratórias, assentei num itinerário: levantar-me meia hora ou três quartos de hora mais cedo, ir a pé do Rato até Santos (fazia bem à forma física), a tempo de apanhar o eléctrico “carro operário”, fazer a viagem no meio do proletariado até à estação de Santo Amaro, subir a pé a calçada, e estar bem a tempo das aulas que começavam às 8.30. 1$10 e ida e volta! Para almoço, havia sandes e uns subsídios maternos e maternais.
Uma poupança de 4$90 por dia! Uma fortuna, a somar aos míseros
2$50 do fim-de-semana.
Assim comecei trabalhos práticos de “economia” e entrei para a “classe operária”! Acho que me fez muito bem, e não estou nada arrependido.

6 comentários:

Maria disse...

Olha que lindo......
Agora vou ler-te!

Maria disse...

Tenho que sorrir....
O teupai não era forreta, era só para te ajudar a dar valor ao dinheiro. Depois ele já sabia das ajudas maternas e maternais...
Vê lá se não aprendeste logo a poupar...

Abreijos

samuel disse...

E assim fica desvendado o grande mistério das contas na Suiça e em Barbados e...

Abraço

Justine disse...

Está muito bem descrita, a tua origem proletária! Quem diria, num carro eléctrico...

Anónimo disse...

Mas que jovem tão formoso!

Esse espírito de poupança também foi incutido, pelo mesmo processo, no Sérgio e na Catarina e, vê lá tu, ela também é economista.

Campaniça

Sérgio Ribeiro disse...

É verdade. Não me queixo. Agora. Mas então queixei-me.
E, depois, houve sempre hábitos (ou princípios... de vida) que ficaram arreigados, e têm sido muito úteis.
Em nome do pai, agradeço-vos a interpretação das intenções.
E, durante a noite meio-dormida, "apareceu-me" outra estória. Vou já contá-la que tenho agora um intervalo, antes de ir lá abaixo "à vila".