O Toino andaria pelos treze/quatorze anos (sabia lá ele…), o seu corpo parecia precocemente formado e calejado, a voz rouquejava, era o adulto em idade de criança, o homem que não tivera a infância que ainda estava em idade de viver. Lembrava‑me os Esteiros, do Soeiro Pereira Gomes, e o Gineto. Falei‑lhe do livro, fui buscá‑lo à estante porque é dos que estão sempre à mão, sugeri que o lesse. Não se fez rogado, disse que até gostava de ler e acrescentou, com convicção, que não queria esquecer-se de ler. Achei piada à observação.
Assim se entretecia uma amizade que me dava alguma satisfação, em encontros de fim-de-semana, de quinze em quinze dias, três em três semanas, que, além do mais, me ajudavam a pensar que não perdia o pé, que mantinha contacto com realidades fundas da sociedade portuguesa. Pelo que mais me irritava o olhar de través com que familiares e amigos avaliavam o meu relacionamento amigável com o Toino, as crescentes reservas ao comportamento do puto, os avisos e os conselhos que me davam repetidamente. Que não lhe desse confiança...
Até o responsabilizavam, sem quaisquer provas, pelo desaparecimento de rádios de carros na vizinhança, que tinha sido mais uma desgraçada imitação do que acontecia pelas cidades.
E como tinha havido esses e outros roubos onde nunca tal acontecera antes, sem se ter descoberto o ladrão, tinha de ser o Toino.
Ele fazia de conta que não ligava, mas eu sabia que não lhe era indiferente toda aquela má fama. Reagia à sua maneira, com tendência para se fechar e isolar. Mais de uma vez tive de o convencer que não desconfiava dele, que "não me incomodava nada", que podia vir sempre que quisesse, que não se preocupasse com más caras e "maus olhados" e, também, que ele não devia responder na mesma moeda.
O certo é que bem me aconselhavam. Eu não queria era crer, teimoso como sou e como diz e me avisa quem meu amigo é...
Quando se aproximou o verão, as “vindas à terra” passaram a ser mais frequentes, e todas as coisas começaram a tomar um outro aspecto, como é próprio das mudanças de estação.
Resolvera investir umas poupanças na construção de uma piscina. Não era bem o mesmo que enterrar o antigo tanque da velha propriedade, do quintal, como eu gostava de dizer desvalorizando a iniciativa.
Assim se entretecia uma amizade que me dava alguma satisfação, em encontros de fim-de-semana, de quinze em quinze dias, três em três semanas, que, além do mais, me ajudavam a pensar que não perdia o pé, que mantinha contacto com realidades fundas da sociedade portuguesa. Pelo que mais me irritava o olhar de través com que familiares e amigos avaliavam o meu relacionamento amigável com o Toino, as crescentes reservas ao comportamento do puto, os avisos e os conselhos que me davam repetidamente. Que não lhe desse confiança...
Até o responsabilizavam, sem quaisquer provas, pelo desaparecimento de rádios de carros na vizinhança, que tinha sido mais uma desgraçada imitação do que acontecia pelas cidades.
E como tinha havido esses e outros roubos onde nunca tal acontecera antes, sem se ter descoberto o ladrão, tinha de ser o Toino.
Ele fazia de conta que não ligava, mas eu sabia que não lhe era indiferente toda aquela má fama. Reagia à sua maneira, com tendência para se fechar e isolar. Mais de uma vez tive de o convencer que não desconfiava dele, que "não me incomodava nada", que podia vir sempre que quisesse, que não se preocupasse com más caras e "maus olhados" e, também, que ele não devia responder na mesma moeda.
O certo é que bem me aconselhavam. Eu não queria era crer, teimoso como sou e como diz e me avisa quem meu amigo é...
Quando se aproximou o verão, as “vindas à terra” passaram a ser mais frequentes, e todas as coisas começaram a tomar um outro aspecto, como é próprio das mudanças de estação.
Resolvera investir umas poupanças na construção de uma piscina. Não era bem o mesmo que enterrar o antigo tanque da velha propriedade, do quintal, como eu gostava de dizer desvalorizando a iniciativa.
E a novidade despertava curiosidade. Era natural, não havia outra piscina uns bons quilómetros em redor.
O dito verão aproximou‑se quente. O que veio aumentar a expectativa e o interesse pela piscina. O Toino tinha acompanhado a construção da estrutura de betão, o revestimento a pequenos azulejos. Tinha sido contratado pelo empreiteiro para dar serventia, e várias vezes o vi em funções, questionando-me e questionando eu sobre trabalho infantil. Sem êxito. Até porque o próprio Toino dizia que precisava de trabalhar ("p'ra mim e p'rós meus irmãos mais novos"), afirmava que estava a fazer aquele trabalho de vontade, e também com muito gosto... por ser para mim.
O Zé aparecia umas tardes por outras, mesmo já no fim dos dias, não para dar qualquer ajuda mas para levar com ele o Toino, e vislumbrava neste alguma tensão, algum constrangimento, tão fora do seu comportamento habitual.
O dito verão aproximou‑se quente. O que veio aumentar a expectativa e o interesse pela piscina. O Toino tinha acompanhado a construção da estrutura de betão, o revestimento a pequenos azulejos. Tinha sido contratado pelo empreiteiro para dar serventia, e várias vezes o vi em funções, questionando-me e questionando eu sobre trabalho infantil. Sem êxito. Até porque o próprio Toino dizia que precisava de trabalhar ("p'ra mim e p'rós meus irmãos mais novos"), afirmava que estava a fazer aquele trabalho de vontade, e também com muito gosto... por ser para mim.
O Zé aparecia umas tardes por outras, mesmo já no fim dos dias, não para dar qualquer ajuda mas para levar com ele o Toino, e vislumbrava neste alguma tensão, algum constrangimento, tão fora do seu comportamento habitual.
5 comentários:
Os amigos escolhem-se a família é-nos imposta!
Espero que a Toino, não venha a ser uma decepção.
Contudo, temos que reconhecer há erros que se praticam, sem avaliar a afectividade que na realidade há pelo “outro”, perdendo-se assim, amigos sinceros.
Gostei muito da troca de livros. Os Esteiros, que melhor livro se podia escolher para o Toino? Belíssimo livro, também fala das relações humanas, entre as crianças mais desfavorecidas, o trabalho infantil, a amizade, a lealdade.
Este conto é, fascinante!
GR
Ops!
Pensava que já estava publicada a folha 5!
Vou dar mais uma voltinha, fazer uma visitas.
bjs,
GR
Vai já. Vai já.
Já está!
Obrigado, amiga.
Até parece que já vivi, eu própria, isto.....
Continuo a preferir o Toino, vá lá saber-se porquê...
"...que não queria esquecer-se de ler."...
Esta frase quer dizer tanto...
"...sem se ter descoberto o ladrão, tinha de ser o Toino."...
Quantas vezes, quantas, isto é, ainda hoje, aplicado, só porque o Toino era mais desfavorecido que o Zé.....
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