faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

domingo, 9 de março de 2008

Histórias ante(s)passadas - 5

Memória de amigos que é como se família fossem, ou tivessem sido, também são o alimento destas histórias ante(s)passadas.
Nos convívios com amigos que de nossos pais eram, com os vizinhos e nas escolas por onde se andou se foram forjando amizades. E memórias. Muitas, sei agora, nasceram aqui, na aldeia, no Zambujal, num mundo que era outro que não o do quotidiano alfacinha, e que sempre me pareceu muito mais são, bem mais humano.

Do ti’Zé “Alfaiate” guardo uma saudosa memória.
Sinto que cresci muito na convivência com ele, nas cumplicidades que criámos, ele amigo de infância do meu pai, que o ensinara a ler umas letras e a fazer umas contas, e eu o menino que andava no liceu e vinha lá de Lisboa. Os exemplos não serão todos os mais aconselháveis, como o daquela vez em que me passou um copito para a mão e, com o corpanzil, me escondeu das vistas de meu pai para que eu pudesse beber o que me apetecesse e fui tirando directamente da vasilha da sua adega… De qualquer modo, ele ia controlando e não teve consequências impróprias para a minha ainda relativamente tenra idade.
Tocava saxofone na filarmónica dos Castelos, e fazia parceria com outra figura muito interessante o ti’João Mendes do Casal Novo, um ruivo também bem alentado, que com ele pousa na fotografia, estando à esquerda dos dois o Manel “Alfaiate”, o filho do ti’Zé.
De muitos ditos e graças dele me lembro, e uma agora me ocorre. Um dia, estávamos todos à lareira da casa deles, e falava-se de alturas – eu sofria por ser pequenino… – e ele saiu-se com esta:
“Pois é… isto das alturas é uma coisa muito estranha… ‘inté parece que, na cama, a ‘nha Júlia (que, pequenita, tinha aí menos aí uns 30 centímetros de altura que ele) e eu temos os dois o mesmo tamanho… as nossas cabeças estão nas almofadas e os nossos pés – e outras partes… – estão à mesma altura…”
e com um dos ares mais marotos, ainda acrescentou
"…e se alguma coisa cresce, ‘inda é, de vez em quando…, cá o meu instrumento…”
“Ó home… nã tens juízo nenhum… só dizes asneiras… o raio do home…”
(corou a ti’Júlia enquanto os outros, os meus pais e eu, estalavam de riso).

6 comentários:

Maria disse...

:) :) :) :) :)))))))))))))))))))))
Parece que estou a ver um filme.....

Boa noite!

Justine disse...

Ele estava a referir-se ao saxofone, não era??? É que eu nunca saio à noite...

GR disse...

Mais uma agradável passagem pelas tuas (muitas) memórias.
O Ti Zé sabia falar! não foi brejeiro e explicou de forma escorreita, uma realidade!

Parabéns, estou encantada com as tuas memórias.

GR

samuel disse...

Outros tempos... :)

Sal disse...

Que história deliciosa. Tens livros editados? Se não, pensa nisso. Se sim, desculpa a ignorância.
O que é certo é que esse senhor escolheu muito bem o instrumento na banda.
Eu própria tenho uma quedazinha pelo saxofone...

GR disse...

Sal,
Tem vários livros. Muito bonitos. Porém, um deles é lindíssimo, de leitura obrigatória "Confesso que vivi".
A vida de um Resistente. A dura Luta dos Comunistas.
Um livro muito comovente,cheio de beleza.

GR