faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

domingo, 4 de novembro de 2007

A morte da adolescência - 9

Depois daquela quinta-feira, no resto das férias, vivi um período difícil. Complicado. De obsessão.

Todos os meus esforços, toda a minha disponibilidade, toda a minha organização de vida, tinham o objectivo de arranjar tempo e espaço para ficar a sós com Júlia. E repetir, em todos os lugares e qualquer que fosse a hora, os mesmos gestos nascidos do desejo.

Ela sabia-o, e geria com grande habilidade o que parecia incontrolável. Moderava impulsos e excessos. Evitava riscos e aventuras, criava condições inimagináveis para que os nossos corpos se encontrassem e misturassem. Apressada, furiosamente.
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No fim das férias, no regresso a Lisboa, tudo se modificou. E tudo continuou.

A Júlia passara o “período experimental” e fora admitida ao serviço da casa, com aquele paternalismo que os “senhores de Lisboa” praticavam nas relações com a “gente” da terra. Relações em que também havia amizade mútua, que outra não há.

Mas era assim a vida de então.

E tudo mudou. E tudo continuou. Noutros espaços, não livres e abertos, com horários apertados, numa outra ainda mais difícil clandestinidade.

Na universidade, para onde entrara nesse ano, tinham-me colocado numa chamada “turma de empregados”, e as aulas práticas, a que não se podia faltar, começavam às 8 da manhã. Tinha de sair de casa pouco depois da 7, quando os meus pais ainda dormiam profundamente.

Levantava-me muito cedo, deslizava para a casa de banho, e muitas manhãs, quase todas as manhãs, era logo seguido pela Júlia, que ainda mais cedo se levantara e fora para a cozinha começar a labuta.

E eram manhãs loucas. Abraçávamo-nos quase com desespero, beijávamo-nos fazendo de cada manhã uma surpresa, num frenesim as nossas mãos trocavam de corpos e percorriam o do outro em todos os caminhos. Sentava-me na sanita e o seu corpo, rijo, belo, carnudo, fazia-se penetrar pelo meu sexo erecto, rolávamos na banheira ou nos azulejos do chão num abraço em que os dois corpos se misturavam com pijamas, camisas de dormir, toalhas, Sempre numa sôfrega correria, calando gargalhadas, amordaçando os gritos da explosão do prazer.

E a correr, bebido o leite e com a “carcaça” na mão, ia para rua e para o autocarro, enquanto a Júlia, com um controlo e uma eficiência espantosos preparava tudo para o acordar dos meus pais. Desde o apagar dos sinais das nossas “loucas manhãs” até aos pequenos-almoços e outras lidas.

5 comentários:

Maria disse...

O João Luís vai ter que começar a levar duas "carcaças" na mão, pois vai emagrecer rapidamente...
Espero que a Júlia tome os cuidados necessários, já que ele não o vai fazer, para não haver surpresas não desejadas....

Até logo

Justine disse...

Não havia perigo, Maria, porque eles "brincavam" de dia, e naquele tempo só se engravidava se se "brncasse" de noite!!

Anónimo disse...

A dona justine está a fazer batota. É que ela conhece uma verdadeira anedota familiar do autor da estória que tem de ser esclarecida.
É que o avô do autor terá convencido a avó sua muito estimada (e muito enganada...) esposa que havia "coisas" que só se faziam de noite. O que ficou a ser conhecido por um dia ter ficado espantada por uma "criada da casa" ter aparecido grávida: "Não é possível!", dizia a avó deste e de mais netos, "a rapariga nunca saíu cá de casa à noite!"

"A rapariga" não se chamava Júlia, acrescente-se já.

GR disse...

Pois é! A Júlia vai engravidar, o jovem JL é ainda muito irresponsável, para se preocupar com o futuro, por certo nem se quer se lembrou deste pequeno (muito grande)promenor. O que irá acontecer?
Ri com o conto da “avó enganada”, inocencia tão doce!
GR

Maria disse...

É verdade.... também só "era perigoso" ir ao cinema à noite, pois à segunda sessão (naquele tempo, a sessão apetecível de quam sai do emprego) podíamos ir à vontade....
... como se as coisas não se fizessem a qualquer hora...
E afinal, não é de manhã que se começa o dia?

Abreijos, que estou a gostar da estória