faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.

...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.

José Gomes Ferreira

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Esta é a pedra

Esta é a pedra!

Esta é a pedra-mãe desta Casa.
Sobre ela se construiu a Casa, e é o que resta do que foi a Casa. Como era.
Agora, nesta manhã, nela se espreguiça a sombra das ripas da janela, trazida pelo sol ainda nascente.

Por esta pedra, soleira de todas as portas, sempre se entrou para a Casa, sempre se saiu da Casa.
No começo de tudo, com serventia para os currais e para o forno, para se ir dar a comida ao gado, para fazer uma merendeira; para se sair a labutar na fazenda, enxada às costas, para a ela se regressar, corpo cansado, ao som das avé-marias.
Quanto pé descalço a pisou, a afeiçoou!
Teve por companhia tábuas de solho, que com ela se juntavam, agora são quadrados de tijoleira que se ajustam aos seus irregulares contornos.
A porta já não é a da fundação, de madeira robusta e gateira para os gatos virem caçar os ratos que abundavam; as paredes foram rebocadas e parecem, por isso, outra coisa que não o que foram.

Esta é a pedra! Não a bíblica mas o assentamento de tudo que é esta Casa. Aqui nasceu meu pai. Aqui, naturalmente, morro aos poucos, um dia de cada vez, vivendo a alegria de estar vivo e de saber porquê e porquê com quem.

Nesta pedra gosto de me sentar, a atirar a vista e o pensamento pelos verdes lá de fora e dos longes.
Desta Casa gosto de falar. E sou feliz por não ser só eu, e haver quem o faça de outra maneira, com outros olhos, com outro sentir igual ao meu. Com o igual sentir que há um encanto, uma magia, uma ternura. Um estar bem.

Esta é a pedra!

5 comentários:

Justine disse...

E assim nos completamos: tu com os primórdios, eu com aquilo que a sorte me deu a viver.
E assim nos misturamos: olhando na mesma direcção, neste cair de tarde das nossas vidas. Com uma grande alegria (para não dizer imensa...)

Anónimo disse...

Tenho a alegria de algumas vezes ter pisado/ultrapassado "essa pedra", não pela pedra mas pelas pessoas com quem aí conviví. Essas sim, para mim teem real valor.
Grata sou pelos momentos de alegria e solida amizade.
Feliz sou ainda por poder continuar a conviver com alguns desses amigos. Não só porque indica que tanto eles como eu ainda temos tarambelhos para apreciar bom convívio, mas porque ainda nos divertimos muito.

Maria disse...

Pedra-mãe!
Descreves, como poucos, o amor pela "terra" pedra, que poderia ser água, porque é o mesmo.
De ternura é essa casa cheia. De calor humano e amizade também.
Talvez por isso gostem tanto os teus amigos de por aí se pass(e)arem...

Abreijos aos dois

Sal disse...

"Um estar bem" que é, afinal, tudo o que cada um de nós deseja.
Tanta ternura neste texto...
beijinhos

Sérgio Ribeiro disse...

justine - a resposta está no "post" seguinte.
"gabby" - Olá. Mas que prazer me dá esta visita! Quando é que nos encontramos para reviver esses saudosos momentos?
maria - talvez... Apareçam sempre, que a tal ternura tem de ser alimentada com a vossa amizade.
sal - tenho de me repetir? Então aí vai: apareçam sempre, que a tal ternura tem de ser alimentada com a vossa amizade.
Abreijos