Então... eu conto de outra maneira. Mais ficcionada. Por isso, talvez mais verdadeira:
A minha avó Damásia, sentada numa cadeira baixinha, na varanda envidraçada que dava para o pequeno quintal, com as mãos ágeis enredando numas enormes agulhas fios de novelos de lã, tricotava uns peúgos ou umas peúgas (como então se dizia). E ia sussurrando, à maneira de ladainha, "uma meia meia feita/outra meia por fazer...".
O meu avô Albino, precocemente reformado da Administração do porto de Lisboa, no tempo em que as reformas eram só para os funcionários públicos, andava por ali, a fazer horas para ir jogar o seu dominó no Jardim Cinema (ou outras "saídas" lá dele...), e resmungava audivelmente "pois, pois... nossa senhora faz meia/com linha feita de luz/o novelo é lua cheia/e as meias são para jesus (dizia a gaja...).
A minha avó sorria, e ripostava "lá estás tu, homem!, c'as tuas coisas... 'inda Deus te castiga... as meias são p'rós nossos netos, os nossos Meninos Jesus... uma meia meia feita/outra meia por fazer".
E duravam anos aqueles peúgos (ou aquelas peúgas), aquecendo os nossos pés que cresciam. Na memória ainda estão bem vivos (ou vivas).
3 comentários:
...mas assim fica muito melhor contadinho...
Sabes que quando me lembro muito das coisas que as avós faziam ou nos diziam vem-me sempre à memória uma frase que elas diziam "quando vamos pra velhos lembramo-nos de coisas que não lembram ao diabo".
Será que estou a ir pra velha?
:)
Obrigada por esta memória
Um beijo
E continuam a aquecer!
Maria: eu estou com a mesma doença que tu...será epidemia? :))
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