Demorei tanto a convencer-me que tinha feito 80 anos que quando dei por mim já estava com 81!
Quem de si se esconde perde a juventude.
Quem o feio desalma os bonitos beatifica.
faz de conta que o que é, é!... avança o peão de rei.
...
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.
José Gomes Ferreira
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.
José Gomes Ferreira
sábado, 28 de janeiro de 2017
domingo, 15 de janeiro de 2017
ao correr do tempo
Tive sempre (muito) jeito para jovem
irrequieto,
irreverente e esperançoso
Durante décadas cá me safei como adulto
resistente
e "adúltero"... mas coerente
Falta-me – desconfio… - a
vocação para velho
arrasta-pés,
resmungão, desistente
domingo, 8 de janeiro de 2017
CENAS DA VIDA DOMÉSTICA (ficcionadas)
(QUASE) FEBRIL
A juntar a sinais e sintomas anteriores, ele espirrou três vezes
seguidas. Com espalhafato. Embora contido.
Ela respigou. Contida, mas visivelmente. Ou oralmente, com resmungo.
E, em voz alta, carinhosa (não tanto como a que usa para o gato…), decidiu
“… ´tás com gripe… vamos ver a
febre…”.
Ele, enquanto metia o termómetro (não pelo lado que ela entendia ser o
certo…), foi ripostando:
“… não sinto febre… estou apenas constipado,
embora fortemente”.
E tossiu. Fortemente.
Sem mais palavras, passou o tempo necessário para a resposta do
termómetro.
Que ele se apressou a ler, vendo o mercúrio entre os 36,8 graus e os 36,9
graus.
“36 e 8… não tenho febre!”, proclamou
ele (um pouco) triunfalmente.
Ela pegou no termómetro, mirou-o, revirou-o com todo o cuidado, e concluiu:
“… mais para 36 e 9 que para 36 e
8… já se pode dizer que é febre… vais já para a cama, que eu levo-te um copo de
leite quente com mel e um Ben-Uron!”
Ele foi.
Está
melhorzinho. Da constipação…
sexta-feira, 6 de janeiro de 2017
Levanta a cabeça... ou
Se
- ao baixares a cabeça -
dos teus olhos se soltarem lágrimas (artificiais ou não),
do teu nariz pingar muco ou ranho,
da tua boca escorrer baba ou resmungo;
se as tuas mãos frias
e os teus dedos incertos
não tiverem outras coisas para nos dizer
ou não sejam capazes de o fazer...
Se não conseguires levantar a cabeça
(sem lágrimas, ranho, baba),
as tuas mãos não ganharem calor,
e os dedos continuarem a errar as teclas...
... desiste
- temporariamente! -,
pousa a cabeça numa almofada,
e vai dormir uma sesta!
- ao baixares a cabeça -
dos teus olhos se soltarem lágrimas (artificiais ou não),
do teu nariz pingar muco ou ranho,
da tua boca escorrer baba ou resmungo;
se as tuas mãos frias
e os teus dedos incertos
não tiverem outras coisas para nos dizer
ou não sejam capazes de o fazer...
Se não conseguires levantar a cabeça
(sem lágrimas, ranho, baba),
as tuas mãos não ganharem calor,
e os dedos continuarem a errar as teclas...
... desiste
- temporariamente! -,
pousa a cabeça numa almofada,
e vai dormir uma sesta!
quarta-feira, 4 de janeiro de 2017
Crónica de um amanhecer hesitante
Hesito, ergo existo. Olho lá
para fora e não chove nem faz sol e, aqui ao lado, ela dedica-se às palavras cruzadas
do avante! e protesta perante as
gralhas (noutras horas do dia é face às do Jornal
de Letras), depois da última etapa do seu pequeno-almoço que, de tão lauto,
pequeno é que não é.
Hesito entre o voltar para a cama como me pede o corpo, ou começar pelo
tratamento pingado nos olhos que pingam, ou tomar os “pózes” em copo cheio de
água em preparação para a colonoscopia, ou banquetear-me com o meu pequeno-almoço
que, de tão pequeno, nem de almoço merecia ter o nome após o hífen.
Hesito. Não me mexo de onde estou, e não tenho que me sói dizer porque calo
(ou surdino) as queixas que são minhas e não comento aquelas suas com que ela
se antecipou, isto depois – ou pelo meio – de alguns trocos sobre coisas várias
e a bela crónica lisboeta do Chico Mota dedicada ao Zé Pires, que não foi
obituário porque de 2004 mas como que antecipada homenagem ao amigo que trazia
a morte (ou o medo dela) consigo.
Hesito. Ainda esboço levantar-me de onde vejo os verdes ainda húmidos e
cinzentos para ir mudar de roupa, mas para quê se, daqui a pouco, quando for
hora de sesta, vou dar uso ao pijama que agora me convida à redeita imediata. Fico-me
pelo esboço ou intenção de acção. Deixo-me ficar assim… pelo menos mais um
bocadinho.
Hesito. Mas… tenho de me decidir porque o relógio não pára de medir e de
me dizer o tempo que passa por muito que eu o queira quieto. Como me apetece
estar.
Reajo. Avanço, decidido – é como quem diz… – para as coisas a fazer, que
inadiáveis são e adiadas estão. Pela hesitação.
Por ordem: copázio de água com “pózes”, duas pequeninas torradas com chá
açucarado, esta crónica de um amanhecer hesitante.
Aqui está ela.
Vamos ao dia que a manhã vai alta! Ainda de pijama… e pingos nos olhos.
Comecemos pelos mails e pelos blogs.
segunda-feira, 2 de janeiro de 2017
arroubos sobre os rombos
Andámos dias proustianamente em busca da frase perdida. Acusando as idades do que não é mais que o papel destas: somarem anos, e SÓ um a um.
Depois, feliz da juventude recuperada pela memória, ela lembrou-se. Mas ele achou que não tenha sido bem assim. Ou que podia ser melhor...
Ficou assim (para memória futura):
Ele, o gato deles, de vez em quando esquece os rombos da juventude roubada e tem arroubos de arromba!...
(é como nós, pensámos os dois)
Recuperado ao acaso e por acaso
Todo o Mundo é Ninguém
ou Nada é Tudo
ou Tempo todo começa a ser Nenhum tempo
Todo o mundo: Estás pr’aí a estrebuchar…
Ninguém: Estou a ver se consigo…
Todo o mundo: A ver se consegues… só consegues é fazer-me
rir… tristemente
Ninguém: Cala-te! Deixa-me… Deixa-me tentar… Deixa-me ver se
consigo.
Todo o mundo: Então não havia de deixar… claro que deixo… Mas
Ninguém me deixa rir? Ora essa… Todo o mundo deixa que Ninguém tente lá à sua vontade.
Ninguém: … mas se Todo
o mundo me ajudasse…
Todo o mundo: Isso não! Nem penses...era só o que faltava… Todo o mundo a ajudar Ninguém… Tens cada uma! Ajudar-te?! A tentar
o quê? Com quem? Para quem? Não vais conseguir Nada.
Ninguém: Contigo, com Todo
o mundo talvez Ninguém conseguisse
Tudo.
Todo o mundo: Comigo? Não contes com isso. Ninguém pode contar com ajuda. Todo o mundo tem mais que fazer…
Ninguém: O que é que tu, Todo
o mundo, tens para fazer que te impede de ajudares Ninguém?
Todo o mundo: Nada.
Mas dá-me muito trabalho. E que queres tu fazer?
Ninguém: Tudo… já
te disse
Todo o mundo: Não tens tempo!
Ninguém: Tenho o tempo todo.
Falta-me é a ajuda de Todo o mundo.
Todo o mundo: Pois é! Ninguém
ajuda ninguém. E já não tens nenhum tempo. A culpa é só tua.
Ninguém: Eu sei! Ninguém
carrega com a culpa de Todo o mundo. Nada
consigo de tudo o que tento. O tempo todo já é nenhum tempo.
27.06.2003
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